segunda-feira, 13 de abril de 2015

SOBRE O DIREITO A SOLITUDE

Não, esse não é um assunto novo. Creio que há uma centena de textos circulando por aí.
 Por que então escrever sobre ele? Porque com tanto livro de auto-ajuda, com tanta receita de auto-estima, estar sozinho é o bicho-papão de muitas pessoas. 
Sim, você pode estar sozinho rodeado de gente. Aliás, em tempos de smartphones com internet 4G, o sentimento de solidão é mascarado sob o pseudo-contato humano produzido nas redes sociais. 
Vamos enfrentar  nosso bicho-papão? Minha experiência profissional e auto-observação me mostra que ele amedronta mais as pessoas que que tem dificuldade em (re)conhecer-se, ou ainda, que produzem um referencial de si mesmas a partir dos papéis sociais que representam na vida de outras pessoas. Essa característica independe de gênero, porém, me parece que há uma vulnerabilidade maior nas mulheres, uma vez que é parte do imaginário social a idéia de que faz parte dos atributos femininos a condição de cuidadora dos que estão a sua volta.
A conquista de direitos femininos trouxe consigo a pressão por desempenho, o cumprimento de tripla jornada de trabalho, fazem com que as mulheres se igualem aos homens também nas estatísticas de adoecimento... e a vulnerabilidade feminina aumenta nas mulheres que ainda carregam consigo a crença, mesmo que inconsciente, de que uma mulher sozinha não vale muita coisa (mulheres da minha geração, lembram quando a gente pulava feito louca dançando "você precisa de alguém que te dê segurança, senão você dança?).
Vejo muitas mulheres perderem-se nos cuidados e atenção aos que estão a sua volta, sejam filhos, companheiros, colaboradores, patrões...  Desconectam-se de si mesmas. A alma passa a mandar mensagens criptografadas, muitas vezes na forma de doenças. A depressão é frequente, mas também as enxaquecas, gastrites, intolerâncias alimentares, alergias, hipertensão são mensagens criptografadas da alma. Cada vez mais nos enxarcamos de anestésicos que ao invés de possibilitar a compreensão das mensagens, as tornam cada vez mais obscuras e complexas. 
Então, se em meio a tanta gente, tanta conquista, tanta coisa pra fazer,  você ainda se sente vazio, solitário ou doente, significa que você abriu mão de um direito fundamental: o direito a solitude.
Solitude é o ato voluntário de estar só. A oportunidade de defrontar-se, desligar botões que te conectam fora para conectar-se dentro. Silenciar os barulhos externos para ouvir os sons, ou ruídos, da alma. Respirar sem a  máscara, que muitas vezes de tão usada está colada à cara (como já disse Fernando Pessoa em Tabacaria). 
A solitude possibilita identificar quais os monstros precisam ser mortos, o que fazer de anseios e expectativas frustradas. Investir na releitura dos sonhos, ou na releitura daquele livro que você leu na adolescência. Ligar-se ao próprio umbigo para poder seguir em frente. 
Não abrir mão do direito a solitude é uma ato de coragem e de amor.